Em 11 de julho, comemoramos 100 anos do nascimento de César Mansuetto Giulio Lattes, considerado nosso maior cientista e incentivador da ciência no país. Nascido em Curitiba, em 1924, filho de imigrantes italianos, Lattes formou-se no equivalente ao ensino médio aos 15 anos e ingressou na USP para graduação em matemática e física. Em 1943, graduou-se na primeira turma de física da universidade e se tornou pesquisador em tempo integral, mesmo antes de existir um programa formal de doutorado. Nesta época, a universidade ainda estabelecia seu departamento de física, que se situava dentro da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, a FFLCH.
Fundação do CBPF e Carreira Acadêmica
Aos 25 anos, Lattes ajudou a fundar o Centro Brasileiro de Pesquisas Física (CBPF), ao lado de outros nomes importantes da física brasileira, como Mário Schenberg, Marcelo Damy de Sousa Santos e José Leite Lopes. Esses cientistas, após se formarem, ingressavam nas linhas de pesquisa do departamento e contribuíam significativamente para a ciência nos seus temas de interesse.
Contribuições Científicas e Reconhecimento Internacional
César Lattes é tido como o mais brilhante dessa geração de cientistas. Tanto por suas duas indicações ao prêmio Nobel, resultantes de sua longa vida como professor e pesquisador, mas muito também por sua defesa vocal da soberania científica brasileira. Após se formar na USP, ele estabeleceu um laboratório em Chacaltaya, Bolívia, para medir radiação cósmica (partículas elementares da física que entram em nossa atmosfera).
Durante esse tempo na Bolívia, Lattes notou partículas que não seguiam as trajetórias esperadas nas placas de emulsões que produzia. Enviou essas chapas ao laboratório de Cavendish (o mais avançado do mundo em mediação da radiação cósmica na época), na Inglaterra, onde passou a colaborar estreitamente.
Foi nessas chapas que se descobriu o méson pi (atualmente chamado de píon), confirmando predições do modelo padrão da matéria da física. No entanto, em um ato de colonialismo e racismo, o Prêmio Nobel de 1950 foi concedido ao diretor do laboratório, Cecil Frank Powell1, em 1950, embora Lattes fosse o primeiro autor do paper da descoberta2.
Trabalhos e Descobertas na UC Berkeley
Após a colaboração com Cecil Powell, Giuseppe Occhialini e Hugh Muirhead na descoberta do píon, Lattes trabalhou no cyclotron da Universidade da Califórnia em Berkeley. Lá, ele conseguiu detectar e produzir artificialmente o píon em colaboração com Eugene Gardener, uma conquista realizada antes de completar 25 anos.
Retorno ao Brasil e Legado Educacional
César Lattes retornou ao Brasil, tornando-se professor na na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e no CBPF. Posteriormente, aceitou uma posição como professor na USP. Em 1967, ajudou a fundar o Instituto de Física “Gleb Wataghin” (IFGW) em Campinas, onde formou diversos físicos e estabeleceu um robusto programa de pesquisas.
Lattes acreditava que o ensino deveria ser um ato de experimentação. Para ele, os alunos deveriam construir seus próprios equipamentos, pois só assim não se limitariam por aquilo que pode ser medido e estudado.
Defesa da Ciência Brasileira
Durante toda sua vida, Lattes defendeu a ciência brasileira como parte da estratégia nacional. Nos anos do governo Getúlio Vargas, ele foi convidado a pensar o currículo de ciências, vendo isso como uma forma importante de desenvolver tanto a ciência quanto a sociedade.
Comemorando o Legado de César Lattes
Comemoramos os 100 anos de nascimento de César Lattes com o espírito de experimentação e ensino que ele defendia. Seu legado de uma ciência cidadã e soberana continua a nos inspirar. Sobre o Nobel perdido, Lattes costumava desdenhar, talvez com razão: “Esses prêmios não ajudam a ciência”. César Lattes fez mais pela ciência brasileira ao não ganhar o Nobel, dedicando sua vida à educação e ao avanço científico no país.
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